Recomeçar, refazer, reconstruir, verbos que compartilham um mesmo aspecto, dar um novo início ao que já existe. Podemos falar de qualquer assunto amor, amizade, relações, estruturas desfeitas que buscam uma recomposição.
Falamos aqui do amor, de uma relação e o artigo de hoje não trata daqueles que terminaram namoros ou casamentos, mas sim daqueles que perderam seus parceiros, que se tornaram viúvos, órfãos repentinos do amor conjugal e se encontram na hora do recomeço e dos conflitos que dele derivam.
Houve uma união, um projeto de vida feito em parceria com aquele que se amava e com quem se compartilhava os dias. Juntos atravessaram a vida, construíram, cresceram, geraram e colheram. Como um golpe que chega sem anunciar acontece uma separação sem escolha, uma despedida sem outra opção. O que se sabia não se sabe mais, o que se conhecia já não se conhece mais e na ruptura da parceria os dias são difíceis para aquele que segue a vida.
O desfazer desse amor interrompido segue de forma muito distinta daquele casal que em comunhão caminhou para a separação. É justamente a percepção da impossibilidade de uma escolha que faz com o que o tempo de cura seja possivelmente mais longo e a forma de cura mais difícil pois ainda que tivessem seus problemas conjugais a despedida não era uma alternativa.
Chego em um ponto sobre o qual sinto grande importância em comentar para aqueles que já sentem alguma possibilidade em recomeçar, uma relação finalizada dessa forma, onde não houve o tempo necessário para a dupla, corre muitas vezes o risco de cristalizar o parceiro perdido em um lugar de profunda idealização, tornando-o um competidor impossível de ser derrotado. Muitos não percebem mas fixam um difícil padrão a ser alcançado e qualquer um que se aproxime correrá o risco de ser enormemente comparado.
Seguindo um pouco mais percebo por meio de alguns e.mails de pessoas que vivem esse momento uma enorme dificuldade em seguir adiante, não pela falta de desejo, mas pelo surgimento da culpa. Sabemos o quanto que a dinâmica interna é conflitante para aquele que se tornou viúvo, tudo que nesse momento é pensado a respeito do que poderia ter sido feito e não se fez, do que poderia ter sido falado e não se falou, de onde poderiam ter chegado e não alcançaram. São sonhos, projetos, amores, uma união interrompida que não teve a chance da despedida e a sensação do inacabado, do incompleto pode ser grande ou devastadora demais para que um se sinta livre para voltar a viver, a desejar.
O terceiro ponto eu diria que é o medo, medo da vida, de novas conquistas, de novas apostas, de novos golpes, de não estar forte, preparado ou reerguido o suficiente para lidar com a vida e tudo que dela advém. É uma fase, que não se sabe o tempo que dura para cada um, de grande vulnerabilidade, de profunda fragilidade e voltar a apostar na vida pode ser incerto demais, inseguro demais.
Compartilhei três pontos em meio a muitos outros que tenho certeza existirem, acredito na relevância deles e sobre a importância em refletir sobre cada um deles e avaliar se interferem na sua busca por novas relações. Não há dívida com aquele que se foi, tudo que foi possível ser vivido certamente bastou enquanto estavam juntos, foram felizes, construíram. Lidar com a dor da perda já é um desafio grande o suficiente, permitir que a idealização, a culpa e o medo entrem em cena em intensidade desmedida apenas tornará o processo ainda mais doloroso e difícil.
A vida continua acontecendo, é fundamental o tempo do recolhimento, da reflexão, da despedida que não pode ser feita, mas aos poucos também é importante que entre em cena a curiosidade pelo mundo que segue lá fora, pelas novas oportunidades, o desejo pelo recomeço, a aposta na esperança, o encontro e o reencontro com a vida.
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